Os números da guerra ucraniana

Por: César A. Ferreira

A guerra em curso na Ucrânia tem atraído a curiosidade de muitos, notadamente sobre as perdas materiais impostas para ambos os contendores. Recentemente, um informe atribuído a inteligência militar das Forças de Autodefesa de Israel, ganhou repercussão. O informe detinha as seguintes marcações:

Perdas russas: 23, aeronaves de caça/ataque; 56, helicópteros (sem especificação); 200,  drones, 889, carros de combate e veículos blindados de transporte (tropas); 427, peças de artilharia (sem especificação); 12, sistemas antiaéreos (sem especificação). Mortos em ação: 18.480 mortos. Feridos em combate: 44.500. Combatentes empregados em campo: 418.000. Prisioneiros: 323, capturados. Reserva de contingente: 3.500.000.

Estes números possuem algumas inconsistências, como apontar o valor de 418.000 combatentes nos fronts do TO ucraniano, visto que a mobilização parcial russa efetivamente convocou 222.000 de um universo esperado de 300.000… Se considerarmos que não há rotação de formações por parte do comando russo, o que não condiz com a realidade, e somarmos o contingente pré – mobilização com o total de convocados, iremos obter a soma de 150.000 + 222.000 que terá o resultado de… 372.000. Certamente algum motivo existe para os analistas de inteligência israelenses apontarem o valor de 418.000, mas, tal motivo foge à percepção pouca deste desatento escriba, devo dizer.

O mais interessante, no entanto, é o relatório das perdas da Ukrowermacht imposta pelas forças russas. As perdas do Ukroreich são as que seguem: 302, aeronaves de caça/ataque; 212, helicópteros; 2.750, drones; 6.320, carros de combate e veículos blindados de transporte (tropa); 7.360, peças de artilharia (não especificadas); 497, sistemas antiaéreos. Mortos em ação: 157.000. Feridos em combate: 234.000. Prisioneiros: 17.230, capturados. Combatentes empregados em campo: 734.000. Mobilização em curso: 100.000.

Um dado relevante deste recorte informativo é que ele não se restringe a informar as perdas dos dois contendores, mas também as perdas do efetivo da OTAN presente (Instrutores, oficiais de inteligência e ligação, observadores, operadores, notadamente dos EUA e do Reino Unido), bem como dos mercenários estrangeiros. Os combatentes da OTAN mortos somam 2.458 almas e os mercenários outras 5.360 … A data de fechamento do relatório israelense é 14.01.2023.

Pois… É interessante comparar as perdas da Ukrowermacht com aquelas divulgadas pelo Ministério da Defesa da Federação Russa. No recorte informativo referente as perdas impostas ao inimigo, os russos apresentaram os seguintes números: 377, aeronaves de caça/ataque; 204, helicópteros (não especificados); 2.948, drones; 402, sistemas antiaéreos; 7.627, carros de combate e veículos blindados de transporte (tropa); 988, veículos lançadores de foguetes; 3.906 peças de artilharia de tubo (morteiros inclusos); 8.171, veículos militares especiais…  É intrigante observar como estes relatórios, ao menos no tocante as perdas impostas aos ucranianos, possuem números próximos, ademais, o informe russo é bem mais recente, já que data do dia 25.01.2023, onze dias de diferença.

Em relação as mortes, observa-se que a proporção é favorável aos russos na ordem de 8:1, proporção que se torna assombrosa numa guerra marcada pelo uso extenso da artilharia, além disto, na proporção havida no tocante às perdas das peças de artilharia de tubo, a ordem resultante é de: 14:1…

Como é bem sabido, números de perdas só podem ser verificados com correção após o término das hostilidades, quando contendores franqueiam acesso dos seus arquivos aos historiadores militares. Durante o curso da guerra o que se obtém são especulações, estando os comentaristas e correspondentes dependentes dos relatórios oficiais das nações em guerra, cuja confiabilidade não pode ser total, por motivos óbvios. No entanto, relatórios advindos de terceiros, como o presente esforço atribuído a inteligência militar israelense, acabam por jogar uma luz, ainda que breve e incerta, sobre aquilo que se passa no campo de batalha.

Notas:

Ukroreich: forma jocosa de designar o governo ucraniano. Analogia referente ao Reich alemão da década de 40 do século passado.
Ukrowermacht: forma jocosa de ser referir as forças armadas da Ucrânia. Analogia referente a antiga Wermacht (Alemanha, século XX)..

Foi revelado para Israel quem é o principal ator da região

O fim da hegemonia de Israel – perdeu um avião no céu sobre a Síria e apelou para Moscou para a salvação dos iranianos.

Autor: Pokrovsky, Alexander

Fonte: Tsargrad. Tv

Tradução: Alexey Thomas Filho

Não, Israel não perdeu fisicamente. A perda de uma aeronave é desagradável, mas não é um absurdo. Tel Aviv tem muitos deles… Israel perdeu moralmente.

Aproximadamente, é possível descrever não tanto os aspectos militares quanto o quadro psicológico/ militar que se desenvolveu no Oriente Médio após este fim de semana. Tal imagem poderia ser chamada geopsicológica, por analogia com geopolítica, quando, em termos formais, nada mudou no confronto dos lados em guerra, mas a imagem psicológica desse confronto tornou-se fundamentalmente diferente.

Batalha aérea no céu sobre a Síria

O que aconteceu? De acordo com o exército israelense, eles interceptaram na noite de sábado um drone iraniano que alegadamente invadiu o espaço aéreo de Israel no território da Síria.

Aqui, deve-se notar,  entre aspas, que a Síria não tem uma “fronteira comum” com Israel. Os limites são divididos pelas Colinas de Golan – território ocupado por Israel, que foi proclamado como seu, unilateralmente, mas reconhecido pelo mundo inteiro como território da Síria ocupado por Israel.

Também se deve notar que a Síria, adjacente ao Golan Heights, ocupada por Israel, acolhe vários grupos hostis a Damasco, incluindo a organização IG / IGIL (EI – Estado Islâmico), proibida na Rússia e no mundo pelo terrorismo. Todos eles estão sob controle óbvio e sob a capa protetora de Israel, que repetidamente bombardeou as forças do governo de Damasco, impedindo que os terroristas eliminados das áreas que ocuparam nas províncias de Deraa e Kuneitra.

Portanto, os drones iranianos não poderiam invadir o território de Israel. Muito provavelmente – embora os iranianos geralmente neguem a sua existência -, o aparelho estava realizando o reconhecimento das posições do IG (EI – Estado Islâmico), contra  o qual o grupo Hezbollah, que está sob o controle do Irã e do governo sírio – aliado ao legítimo governo sírio, está conduzindo uma luta irreconciliável.

Israel, de acordo com sua própria versão, realizou um ataque de “retaliação”, derrubando drones e atacando os “alvos iranianos” na Síria. É desta maneira que é denominada a base T4 “Tiyas” perto de Palmyra – 300 km adentro no território sírio. Foguetes (mísseis balísticos táticos) foram também dispados contra baterias antiaéreas na proximidade de de Damasco, que são considerados alvos “iranianos” por Israel…

Isso aconteceu muitas vezes, como se diz em Jerusalém, mais de uma vez. Parece ser formalmente, o suficiente, mas na verdade, até então, a fraca defesa aérea da Síria não tinha como resistir aos atos aéreos israelenses por um longo período de tempo. E até mesmo quando um caso relativamente recente, onde supostamente uma ave migratória danificou o super-moderno e super-implacável F-35 israelense, o comando judaico não se atentou (alertou-se).

Mas desta vez, deu-se o inesperado, uma verdadeira “resposta” séria chegou: as forças de defesa aérea da Síria lançaram vários mísseis contra as aeronaves israelenses. Como resultado, um F-16 foi derrubado e caiu no território de Israel. Os pilotos ejetaram, mas um deles veio a falecer em função dos ferimentos sofridos.  Além disso, os sírios anunciaram que atingiram e danificaram outras aeronaves de Israel, mas, aqui o fator Oriente entra em jogo e como é sabido, é praticamente impossível estabelecer de fora alguma confirmação que seja. Israel, em qualquer caso, silencia-se sobre este assunto – o que, no entanto, também pode ser explicado pelo mesmo fator Oriente.

Restos_do_F16_abatido
Destroços do F-16I Sufa abatido. Imagem: Reuters.

Quanto ao que exatamente “desbancou” os pilotos também diferem em versões.  De acordo com uma fonte, estes eram mísseis do complexo S-200, de acordo com outras, um dos mísseis do sistema “Pantsir-S1”, que foram transferidos recentemente para o exército sírio. Figuram, também, o sistema “BuK” como um dos heróis dos eventos. Alguns até indicam o S-400, mas isto é, na opinião geral dos observadores militares, improvável. Não no espírito, não no costume e não nos interesses. A menos que os capitães da defesa aérea síria Al-Ekseya. Mas, sem tal força maior, estava na ordem das coisas.

De qualquer forma, os restos de mísseis do S-200 foram encontrados no território da Jordânia e do “BuK” – no vale Bekaa no Líbano.

Um hooligan desdentado apelou para a polícia

Não, inicialmente caindo no estado de “anestesia” advinda da reação inesperadamente eficaz, Israel entrou em colapso nervoso encetando poderosos ataques às posições da defesa aérea síria e iraniana (na Síria). Os subúrbios ocidentais de Damasco foram submetidos a bombardeios. O resultado das invasões (três, de acordo com fontes locais) é novamente contraditório, mas, segundo alguns relatórios, outro vetor israelense foi abatido – helicóptero de ataque “Apache”. A autenticidade da mensagem é a mesma do leste.

Imediatamente, um alarme foi disparado em Israel, os habitantes do Golã foram enviados para abrigos, as decolagens e o desembarque de civis foram suspensos no aeroporto internacional Ben Gurion. Esta é uma evidência clara de que, em primeiro lugar, Tel Aviv, considerou seriamente a possibilidade de uma maior escalada das hostilidades, tanto contra a Síria como contra o Irã. A propósito, de acordo com os analistas, independentemente das ações concretas no futuro próximo, as partes se tornaram, em qualquer caso, em um ponto de inflexão histórica. Ou seja, o caminho para a perda da supremacia incondicional dos judeus no ar (excluindo o fator da Rússia, é claro) e o fortalecimento adicional da defesa aérea árabe e persa, significa, a retomada desta mesma dominação pela exclusão.

Em qualquer caso, do “voo” do “corvo” que danificou o F-35, ao realmente abatido F-16 passou-se um intervalo bastante rápido – alguns meses. E se os sírios – e, portanto, os iranianos – vierem a fechar completamente seus céus ao inimigo, significará uma mudança tectônica nas forças de todo o Oriente Médio. E caso os EUA não possam evitar que os seus aliados no Golfo comprem os sistemas S-400 da Rússia, então a configuração de todo o puzzle de energia na região poderá ser reformatada radicalmente.

Alguns analistas acreditam que, após o incidente atual, os americanos serão mais difíceis de jogar com as sanções: se o S-200, originários da década de 1960 abatem os F-16, o que o S-400 poderia fazer com os aviões israelenses?

É muito provável que em Israel, calculou-se muito rapidamente as consequências, em longo prazo, da atual batalha nos céus da Síria. Porque o “hooligan” decidiu reclamar à “polícia” sobre o comportamento ofensivo da vítima pretendida.

Em outras palavras, Israel se voltou para a… Rússia! Com um pedido para intervir e prevenir a escalada da “violência“. “Israel contatou os funcionários em Moscou com um pedido para transmitir a mensagem à Síria e ao Irã que, apesar de ter dado um poderoso golpe em resposta ao incidente com o drone, ele não está interessado em agravar a violência no futuro”, informou o jornal Times, com referências as fontes diplomáticas de Israel.

Claro, havia outras vozes. Conhecida por seus links com os círculos militares e de inteligência, o portal DEBKAfile acena com os punhos: “os mísseis de defesa aérea sírios que atingiram o F-16 israelense no sábado, 10 de fevereiro, fazem parte de um sistema administrado pelos russos a partir de sua base aérea Khmeimim”.

Bem, como você gostaria? Vamos questionar-lhes: o que você faz no céu da Síria, que tem um acordo de cooperação com a Rússia, incluindo o militar? Sim, vamos adicionar: por que, de fato, você está defendendo os bandidos ISIS (EI – Estado Islâmico) perto das Colinas de Golan, enquanto perde os vetores aéreos?

De qualquer maneira, o apelo a Moscou se deu. E a partir disto não houve continuação de ataques contra as posições das forças iranianas na Síria. E o Irã engrandeceu-se, muito. Não só anunciou que “a era dos ataques israelenses impunes na Síria terminou”, mas também prometeu que “as portas do inferno se abrirão sobre Israel”.

O mediador para a resolução da situação, àquele para o qual se apela para que a luta não chegue ao extremo, por padrão geral tem por escolha, Moscou. Tornou-se para todos no Oriente Médio uma espécie de policial militar.

Nota do Editor do Blog Debate Geopolítico: Ainda está nebuloso, no tocante aos vetores empregados contra o F-16I (Sufa), mas os debris, ou seja, partes do booster de um S-125 (Pechora) foram encontrados em solo libanês, além de partes de um vetor do sistema S-200. Alega a defesa antiaérea síria que os vetores 57E6 do sistema Pantsyr-S1 abateram vários mísseis táticos lançados contra alvos militares e civis em território sírio. As alegações da defesa aérea síria compreendem além do F-16I Sufa, abatido, outro F-16, um F-15I e um AH-64 “Apache”. Israel nega tais alegações e reconhece a perda do único F-16, pelo fato simples de que não é possível negar os destroços fumegantes ao lado de uma rodovia, aos olhos de todos e dos respectivos celulares.

Uma ameaça elucidativa

Por: César A. Ferreira

No campo das relações humanas as ameaças podem incutir muitos significados, desde o aviso literal de uma intenção, em geral agressiva, até a dissimulação de uma vontade, desejo oculto, ou fraqueza. Muito frequentemente oculta o temor, ou a impotência sentida. Ademais se mostra reveladora, também, do estado emocional do emitente.

A ameaça é uma revelação de uma intenção agressiva, doutra forma não seria uma ameaça, não por outro motivo costuma ser algo bastante raro no trato diplomático por motivos óbvios, visto que usar mão de ameaças significa rudeza. Ademais, chefes de governo emprestam um peso grande caso verbalizem uma ameaça… Pois, independente disto, a Ministra da Justiça do Estado de Israel, do nada, emitiu uma ameaça explícita endereçada à pessoa do Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin. Este absurdo diplomático cometido pela Senhora Ayelet Shaked continha as seguintes palavras:

“Se Putin quer sobreviver, ele deve manter suas forças armadas fora da Síria”

É difícil entender o motivo de um Ministro de Estado cometer tamanho desatino. Ayelet Shaked é uma mulher jovem, com formação acadêmica em Engenharia de Sistemas (TI), e alçada ao Ministério da Justiça por ser uma estrela em ascensão no cenário politico israelense, neste contexto é possível especular que a senhora Shaked esteja verbalizando o sentimento existente no seio do poder israelense em relação à Federação Russa e suas ações na Síria, focado no seu líder.

De fato a intervenção russa na Síria mudou o rumo da guerra contra os jihadistas, colocando o governo sírio no trilho da vitória. A derrota dos extremistas significa por extensão a derrota das monarquias do golfo pérsico, das agências de inteligência ocidentais, notadamente da CIA, bem como de Israel, que muito investiu nestes guerreiros do terror islâmico.

Uma prova clara disto é o atendimento médico de extremistas no Ziv Medical Center, hospital israelense que é referência para tratamento de traumas por armas de fogo. O empenho israelense em apoiar os terroristas foi flagrado pelo jornalista Sharri Markson, do veículo News Corp, cuja descoberta foi robustecida posteriormente por outros relatos. Outra evidência do apoio israelense aos terroristas sírios é a captura de instrutores israelenses em Aleppo, bem como da morte de uma quinzena de “instrutores militares” devido a um ataque com mísseis de cruzeiro (Kalibr). Isto, sem falar nos constantes ataques aéreos a Damasco, realizados sempre a partir da fronteira de Israel, além das incursões aéreas dentro do território sírio.

Apesar de frustrar as intenções israelenses no tocante à Síria, a Federação Russa não é um estado hostil a Israel, pelo contrário, as relações politicas e diplomáticas até aqui se apresentam como muito boas, embaladas pela presença de aproximadamente 15% de russos na composição populacional de Israel. O governo israelense conta com apoio russo para o estabelecimento de um acordo de livre comércio entre Israel e a União Econômica Euroasiática, Uma forma óbvia de ampliação de mercados. A pergunta que se impõe é o motivo pelo qual Israel insiste em agredir um parceiro importante em termos políticos e econômicos. A resposta pode ser mais simples do que o pensamento usual: Israel acostumou-se a ser assim. arrogante. Por estar cercado por vizinhos que despreza, Israel atrofiou a sua diplomacia, visto que na região age com apoio explícito dos EUA e seja qual for a demanda, nada mais faz além do uso da força.

Ora, ora… Quando não se pode usar a força plenamente, o que resta além da ameaça?

Assad venceu! O Ocidente talvez não acredite, mas parece que a guerra na Síria está acabando

Por: Robert Fisk
Fonte: The Independent
Tradução: Oriente Mídia

Com todos aguardando que Trump inicie a Guerra Mundial n. 3, nem percebemos que o mapa do Oriente Médio substancialmente, sangrentamente, já está mudado. Passarão anos, antes que Síria e Iraque (e Iêmen) se reconstruam – e os israelenses talvez precisem pedir a Putin que limpe a sujeira em que Israel está metida.

Recebi uma mensagem vinda da Síria, semana passada, no meu celular: “O general Khadour cumpriu o que prometeu”. Entendi perfeitamente.

Há cinco anos, encontrei Mohamed Khadour, que comandava uns poucos soldados sírios num pequeno subúrbio de Aleppo, sob fogo de combatentes islamistas no leste da cidade. Naquela ocasião, mostrou-me seu mapa. Recapturaria aquelas ruas em 11 dias, disse-me ele.

Depois, em julho desse ano, novamente encontrei Khadour, no fundo do leste do deserto da Síria. Estava, disse-me ele, pronto para entrar na cidade sitiada de Deir ez-Zor antes do fim de agosto. Lembrei-o, rematada crueldade, de que na última vez em que ele me dissera que recapturaria parte de Aleppo em 11 dias, o exército sírio precisou de mais de quatro anos! Isso foi antes, disse-me ele. Naquele tempo, o exército ainda não sabia combater em guerra de guerrilha. O exército era treinado para retomar Golan e defender Damasco. Hoje, é diferente. Já aprenderam.

Realmente aprenderam. Em pleno deserto, Khadour disse que bombardearia a cidade de Sukhna – a maior parte do bombardeio ficaria por conta dos russos –, e suas tropas sírias romperiam o cerco por ali até Deir ez-Zor, que estava cercada pelo ISIS já há três anos, com 80 mil civis e 10.000 soldados sitiados. Khadour disse que estaria em Deir ez-Zor mais ou menos dia 23 de agosto. Acertou quase exatamente. E agora avança rumo ao que resta da cidade de Deir ez-Zor e dali rumo à fronteira sírio-iraquiana.

Assim sendo – depois de completada a captura da cidade, e quando Khadour estiver na fronteira, e agora que Aleppo está totalmente em mãos do governo sírio, e só a província Idlib ainda resta como lata de lixo do que resta sobretudo de rebeldes islamistas (incluindo a al-Qaeda), muitos dos quais foram autorizados a viajar em troca de se renderem e entregarem quarteirões e bairros de cidades sírias –, o que sempre foi impensável no ocidente já está afinal acontecendo: os soldados de Bashar al-Assad, ao que tudo indica, venceram a guerra.

E não é só “ao que tudo indica”. Hassan “Tiger” Saleh, oficial estrela do exército sírio – condecorado duas vezes pelo ministro de Defesa da Rússia – abriu caminho até o prédio da 137ª brigada do Exército da Síria em Deir ez-Zor e libertou os soldados que lá estavam, enquanto Khadour, seu oficial comandante (os dois são amigos pessoais) está a caminho de libertar a base aérea na cidade.

Quantos recordam o dia em que os norte-americanos bombardearam soldados sírios próximos daquela base aérea e mataram mais de 60 soldados, permitindo assim que o ISIS avançasse para o resto da cidade? Os sírios jamais acreditaram no que os norte-americanos disseram, que o ataque resultara de “um erro”. Até que os russos ‘informaram’ à força aérea dos EUA que estavam bombardeando forças sírias.

Os britânicos parecem ter entendido a mensagem. Discretamente retiraram semana passada seus instrutores militares – os homens cuja tarefa seria preparar os místicos “70 mil rebeldes” de David Cameron, que supostamente logo derrubariam o governo de Assad. Até o relatório da ONU segundo o qual o regime teria assassinado 80 civis num ataque com gás, no verão, passou quase sem referência entre políticos europeus tão habituados a aumentar os crimes de guerra na Síria e a apoiar o estúpido ataque com míssil cruzador ordenado por Trump contra uma base aérea síria.

E que tal Israel? Aí está uma nação que realmente tinha certeza do fim de Assad, a tal ponto que bombardeou soldados sírios, além de bombardear o Hezbollah e o Irã, aliados da Síria, e dar atendimento médico a terroristas islamistas que fugiam da Síria para cidades israelenses. Não surpreende que Benjamin Netanyahu estivesse tão “agitado” e “emocional” – palavras dos russos – quando Vladimir Putin o recebeu em Sochi. O Irã é “aliado estratégico” da Rússia na região, disse Putin. Israel é “parceiro importante” da Rússia. Duas coisas completamente diferentes, e absolutamente nada do que Netanyahu desejava ouvir.

As repetidas vitórias dos sírios significam que o Exército Árabe Sírio é hoje um dos mais “enrijecidos no calor dos combates” de toda a região; formado de soldados habituados a defender a própria vida, e hoje treinados em coordenação de tropas e de inteligência, a partir de um só centro de comando. Como disse a ex-professora de St Antony’s College Sharmine Narwani essa semana, essa aliança conta hoje com a cobertura política de dois membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, Rússia e China.

Assim sendo, o que fará Israel? Netanyahu viveu sempre tão obcecado com o programa nuclear iraniano que visivelmente jamais imaginou – e nem ele, nem Obama, Hillary Clinton, Trump, Cameron, May, Hollande e outros luminares das elites políticas ocidentais – que Assad pudesse vencer, e que, das ruínas de Mosul poderia nascer um exército iraquiano muito mais poderoso.

Netanyahu ainda apoia os curdos, mas nem Síria nem Turquia nem Irã, nem Iraque têm qualquer interesse em apoiar aspirações nacionalistas dos curdos – apesar de os EUA usarem milícias curdas nas chamadas Forças Sírias Democráticas (muito mais curdas que “sírias” e “democráticas” e sequer algum tipo de “força”, se não contarem com cobertura da Força Aérea dos EUA).

Elementos da direita política israelense que diziam que Assad seria perigo muito maior que o ISIS talvez sejam obrigados a reconsiderar – no mínimo, porque Assad provavelmente será o homem com quem Israel terá de conversar, se quiser manter segura a sua fronteira norte

Exército Árabe Sírio avança no Sul

Por: César A. Ferreira

Com as atenções voltadas para o norte da Síria, por onde se dá o tráfego do contrabando de petróleo que sustenta a insurgência do Estado Islâmico, artéria vital que faz com que este grupo, como outros, como Al-Nusra e ESL se esfalfem para manter as comunicações e abastecimento com a fronteira turca, pouca atenção se dá aos combates efetuados no sul, quando muito são noticias, apenas, pela estranhíssima atitude de Israel em assistir combatentes extremistas do Estado Islâmico em termos médicos, inclusive com resgate e remoção dos feridos para atendimento traumatológico especializado junto ao conceituado Ziv Medical Center.

O Exército Árabe da Síria realizou um movimento amplo na província de Dar, ocupando várias localidades no seu avanço que possui como objetivo a capital provincial, neste presente momento, as forças governamentais já travam combates nos subúrbios do norte da capital. Neste processo, o Exército Árabe da Síria, objetivando a manutenção do fluxo logístico e proteção dos acessos, concentrou-se primeiramente em conquistar e manter a estrada Damasco-Dar, e em sequência capturar a base militar localizada junto à cidade de Sheikh al-Max, 90 quilômetros ao sul de Damasco, cujo controle havia sido perdido em janeiro último (2015). Se for considerada a proximidade com a fronteira jordaniana, que é extrema, tornar-se-á fácil perceber o quão importante é esta base, visto que o controle da fronteira sul é tão vital quanto aquele que se almeja na fronteira norte, pois a Jordânia, ao sul, tal como a Turquia, ao norte, permite o transito de extremistas e de suprimentos para os mesmos.

EAS-sul-damasco
Exército Árabe da Síria comemora vitória ao sul de Damasco. Imagem: Internet.

O relato contrário, da parte extremista, através da voz de Ahmad al Masalmeh, ativista adepto da oposição armada ao regime sírio, informou que o Exército Árabe Sírio havia tomado apenas uma porção da referida base, portanto, que a mantinham em suas mãos oferecendo combate aos soldados regulares sírios. Todavia, em vista do apoio exercido pela Rússia nesta ofensiva, coadjuvada pela FARAS – Força Aérea da República Árabe da Síria, na forma de mais de 80 ataques aéreos efetuados, além do apoio de infantes do Hezzbolah, altamente motivados e com grande experiência em combate, torna-se difícil manter a versão extremista como digna de crédito, ademais, quando o próprio relata que o Exército Árabe da Síria fez uso intenso de barragem de foguetes, artilharia de tubo e morteiros. Há, no entanto, uma convergência de relatos, ambos os lados apontam combates nas cercanias de Sheikh al-Max.

A principal força contra qual se bate o Exército Árabe da Síria na região é a Frente Al-Nusra, esta, por sua vez, alicerçada por uma miríade de pequenos grupos extremistas.  Contra esta nuvem de combatentes insurgentes, fazem frente soldados regulares do Exército Árabe da Síria, combatentes operativos do Hezzbolah e voluntários iranianos. As forças na região travam uma batalha de nítido valor tático e estratégico, mas também simbólico, pois foi em Dar, que se iniciaram os protestos que desaguariam na revolta armada contra o Presidente Bachar Al Assad.