O Mar Negro não perdoa

O “Grande Navio Lança Mísseis” Moskova afunda no Mar Negro enquanto era rebocado para a Base Naval de Sebastopol.

Por: César A. Ferreira

A data de 14 de abril corrente despertou com uma notícia eletrizante, o cruzador lança-mísseis e nave capitânia da Frota do Mar Negro, Moskova, havia sido atingido. No caso, por dois mísseis P-360 Neptune, de fabricação ucraniana. De imediato pouco crédito se deu, pois o lado ucraniano desta guerra lançou tantas farsas [1] nos meios de comunicação que outro comportamento não poderia mesmo ser esperado, ademais, o lado russo desta guerra, se não emite farsas, carece de agilidade informativa e transparência, tudo retendo, nada oferecendo em termos de notícias. Pois… Certas coisas não se podem esconder e logo após aparece uma informação breve que o dito cruzador estava em chamas, devido a “falha de manejo da munição de bordo”.

Atingido, ou não, fato é que a tripulação, cerca de 500 tripulantes, fora transferida para vasos de escolta. Após dominar o incêndio, o informativo oficial apontava que o vaso estava sendo rebocado para a Base Naval de Sebastopol quando afundou devido ao embarque de água em mar encapelado. Temos então uma divergência informativa, entretanto, o embarque de água em mar agitado é indicativo da presença de abertura, ou de aberturas várias no costado do navio, algo que um incêndio interno dificilmente ocasionaria. Outra possibilidade, incrivelmente pouco aventada é o choque com minas marítimas de contato à deriva no Mar Negro. A Ucrânia lançou várias destas minas de fundeio que perderam a sua ancoragem e agora ameaçam a navegação neste mar.

Pode-se dizer que foi um tento ucraniano. Não interessa o curso do destino, mas o destino em si, afinal, se houve incêndio por deficiência no manejo de munições nos paióis, isto se configura em algo mais alarmante do que ser atingido pelo esforço inimigo. O Moskova era a nave flâmula da Frota do Mar Negro, jamais poderia ser atingida e muito menos operada com desleixo e incompetência. Não há desculpa para esta perda e a ausência do pedido de demissão do comandante desta frota assombra. Ao que parece o senso de honra não foi afetado, apesar desta perda poder vir a implicar em mudanças profundas nas operações futuras da Frota do Mar Negro [2].

O possível algoz do Moskova, o P-360 Neptune, é um míssil antinavio produzido na Ucrânia, derivado do Kh-35 Uran, todavia, atualizado com sistemas ucranianos mais novos. É apontado como tendo alcance da ordem de 190 milhas náuticas, mas em geral se atribui 136 milhas náuticas como alcance efetivo. O Moskova, que navegava a 96 milhas náuticas de Odessa, estava bem dentro do seu alcance operacional. Já a belonave capitânia da Frota do Mar Negro era um exemplar da Classe Slava [3], lançado em 1979, comissionado em 1983, descomissionado em 1990 e novamente comissionado em 2000. Suas reformas foram pontuais e o seu sistema anti-incêndio estava desatualizado, segundo informes recentes. A belonave deveria ser segura contra ataques sea skimmer, dado a presença de seis pontos CIWS [4]… Deveria.

A Guerra no mar tem a característica de não perdoar erros, pois as perdas são absolutas. Independente do ocorrido, incêndio nos paióis por erro de manejo, ou impacto por meios do inimigo, a perda do Moskova é trágica, gigantesca e irreparável. Muito mais do que a propaganda poderá explorar, pois simbólica, a ausência da nave capitânia afetará pela sua ausência a moral dos marinheiros da Frota do Mar Negro, podendo influenciar, inclusive, a atitude futura desta frota neste conflito. Na opinião deste escriba, uma corte marcial que envolva o Capitão e os oficiais superiores desta belonave é imperiosa, ainda que seja, por si, algo a mais para ser explorado pelo Ukroreichspropagandaministerium. Como bem sabiam os gregos, o Mar Negro é genioso, nunca foi fácil e jamais perdoou os navegantes incompetentes.

Notas:

[1]: O governo ucraniano não perde nenhuma chance em enganar, primeiro foi o “Fantasma de Kiev”, suposto às de MiG-29, que não passava de imagens renderizadas do jogo DGS – Digital Combat Simulator da empresa Eagle Dynamics.  Depois tivemos a história comovente da “Gravida de Mariopol”, onde uma gestante foi pelas lentes da AP – Associated Press, “resgatada duma maternidade brutalmente atacada”, o fato era que a “maternidade” estava desativada e ocupada pelo A3OV como centro de comando e o dito “resgate” não passou de uma encenação. Marianna Podgurskaya estava realmente grávida e deu à luz. Isto não impediu de que a sua morte, bem como a do seu bebê, tenha sido efusivamente anunciada pelos veículos de imprensa brasileiros, como ”Veja”, ‘Isto É” e “Valor Econômico”, sem que tenha sido emitido uma só nota corretiva. Estes são apenas dois exemplos candentes.

[2]: Sem o Moskova a cobertura de uma possível frota destinada a uma operação anfíbia fica comprometida. Portanto, toda e qualquer ação futura que envolva a Frota do Mar Negro e o litoral próximo a cidade de Odessa, deverá ser a partir deste evento, revista.

[3]: A Classe Slava (Project 1164): 12.490 toneladas de deslocamento, comprimento de 186,4 metros, boca de 20,8 metros e calado de 8,4 metros. O armamento desta classe consiste de oito lançadores com oito células verticais do sistema S-300F (64 unidades) para função antiaérea (mísseis 5V55RM, 90 km de alcance); dois lançadores com 40 unidades para o sistema OSA NA; 6 canhões rotativos CIWS de 30mm AK-630; para a função antinavio exibe 1 canhão AK-130 de 130mm, 16 silos para os mísseis P-1000 “Vulkhan”; 10 tubos de torpedos de 533mm; a função antissubmarino conta com dois morteiros navais RBU-6000. Como defesa passiva possui lançadores de chaff PK2DL de 140mm. Pode levar um helicóptero Ka-27. Esta classe perfaz 32 nós, apresenta resistência (autonomia) de 10.000 milhas náuticas (18.520 km) a 16 nós. A propulsão é de turbinas a gás, acopladas a dois eixos e perfazendo 121.000 shp. O cruzador Moskova exibia o designativo 121.

[4]: CIWS – Close-in Weapon System (ing.). Neste navio representado por seis canhões rotativos AK-630 (30mm).

Nota do Editor:
Após a publicação deste artigo foi anunciada uma vítima fatal dos incidentes ocorridos a bordo do Cruzador Lança-Mísseis Moskova: o falecimento do “Capitão de 1º Escalão” Kuprim Anton Valeryevich. Trata-se do Capitão do Cruzador Moskova. Sendo esta a única vitima fatal anunciada deste naufrágio, não fica difícil acreditar num suicídio motivado pela manutenção do senso de honra.

Nota do Editor 16.04.2022:
Em um vídeo vinculado pelo Ministério da Defesa da Federação Russa, nesta presente data, 16.04.2022, a tripulação perfilou-se em revista pelo Almirante em Chefe da Frota do Mar Negro, Nicolai Evmenov; Acompanhava o Capitão de 1º Escalão Kuprim Anton Valeryevich, que pelo jeito não cumpriu o suicídio ritualístico demandada pela execração moral e cumprimento do senso de honra. Devido a falsa informação da morte do capitão este editor irá reter qualquer nota de complementação sobre prováveis vítimas deste naufrágio até a confirmação cabal. O único detalhe digno de nota é a ausência do gato do Moskova na cerimônia, o que faz este escriba temer pela sorte do felino.